SENTENÇA Rp Nº 0600024-33.2019.6.20.0006
REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0600024-33.2019.6.20.0006 / 006ª ZONA ELEITORAL DE CEARÁ-MIRIM RN
REPRESENTANTE: COLIGAÇÃO A VEZ DO POVO
Advogado do(a) REPRESENTANTE: CAIO VITOR RIBEIRO BARBOSA - RN7719
REPRESENTADO: FRANCISCO DOS NAVEGANTES SILVINO NICÁCIO, ALEXANDRE PACHECO, ANTÔNIO DE OLIVEIRA FERNANDES, DIOGO FIDELIS COSTA
Advogado do(a) REPRESENTADO: CRISTIANO LUIZ BARROS FERNANDES DA COSTA - RN5695
REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA. PLEITO SUPLEMENTAR. DIVULGAÇÃO DE MENSAGENS POR APLICATIVO WHATSAPP. NÃO IDENTIFICAÇÃO DO AUTOR. ANONIMATO. VEDAÇÃO. PUBLICIDADE NEGATIVA. MANIFESTAÇÕES OFENSIVAS. RESPONSAVEIS PELA DIVULGAÇÃO. IDENTIFICAÇÃO. MULTA. INTELIGÊNCIA DO ART. 57-D, §2º DA LEI N.º 9.504/97.
I – RELATÓRIO
Trata-se de representação com pedido liminar proposta pela Coligação “A VEZ DO POVO”, integrada pelos Partidos PSD e PODE, em desfavor de FRANCISCO DOS NAVEGANTES SILVINO NICÁCIO, ALEXANDRE PACHECO, ANTONIO DE OLIVEIRA FERNANDES e DIOGO FIDELIS COSTA, todos devidamente qualificados na inicial.
Alegou a Representante que ajuizara a presente ação contra os representados em virtude destes terem distribuído, por meio de mensagens no aplicativo whatsapp, vídeos apócrifos buscando associar o candidato da Representante, Júlio César Soares Câmara, a casos de corrupção.
Informou, ainda, que em um dos vídeos divulgados pelos representados foram divulgadas inverdades acerca do candidato da Representante, ao afirmar que o ex-Prefeito Marconi Barretto estaria apoiando o candidato Júlio César, quando, na verdade, tratam-se de adversários políticos.
Aduziu, outrossim, que, em um outro vídeo, os representados relacionaram a imagem do candidato Júlio César a atos de corrupção, em matérias jornalísticas que denunciaram desvios de recursos públicos; explicou que a imagem de desfecho do referido vídeo continha a frase: “Cadê o Dinheiro que Tava Aqui”, usada pelo programa Fantástico da Rede Globo, em matérias que denunciam escândalos de desvios públicos.
O pedido liminar requerido pela Representante foi parcialmente deferido pelo Juízo (ID nº 75875), para determinar que os Representados apaguassem as mensagens mencionadas na presente representação e enviadas para grupos de whatsapp e para pessoas que remeteram individualmente, assim como cessassem o seu envio, sob pena de pagamento de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por mensagem, em caso de descumprimento da presente liminar.
No mérito, requereram o julgamento procedente da pretensão, para condenar os Representados ao pagamento da multa disposta no art. 57-D, § 2º, da Lei nº 9.504/97.
Em sede de contestação os representados pugnaram pela improcedência do julgamento, alegando em síntese que: a conduta narrada nos autos não configra propaganda eleitoral, mas se apresenta como exercício da livre manifestação do pensamento; os vídeos veículados não foram propalados de forma anônima; não é possível se aplicar a norma prevista no art. 57-D, §3º da Lei nº 9.504/97, uma vez que publicações realizadas via aplicativo “whatsapp” não se subsume a publicações realizadas em “redes sociais”, uma vez que se trata de aplicativo de transmissão de mensagens de texto.
Em seu parecer, o Ministério Público Eleitoral pugnou pela procedência parcial da representação eleitoral, a fim de confirmar a liminar, bem como pugnou pela improcedência do pedido de aplicação da multa prevista no art. 57-D, §2º da Lei das Eleições aos representados, entendendo não ter havido anonimato no envio das mensagens a justificar tal medida.
Nas alegações finais, a representante requer a procedência do pedido para aplicar a multa constante do art. 57-D, §2º da Lei das Eleições aos representados, defendendo que tal norma alcança também os mensageiros das mensagens apócrifas. Alegaram ainda que os representados silenciaram em relação à ordem proferida na decisão liminar para apagarem as mensagens, requerendo, por tal razão, a aplicação da multa arbitrada.
É o que importa relatar. DECIDO.
II - FUNDAMENTAÇÃO
O objeto da presente lide repousa na transgressão, ou não, das normas previstas nos art. 57-D da Lei nº 9.504/97 e art. 21 da Res. nº 21/2019-TRE/RN, pelos representados. As mesmas estabelecem, in verbis:
Lei nº 9.504/97
Art. 57-D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58-A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
§ 1o (VETADO) (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
§ 2o A violação do disposto neste artigo sujeitará oresponsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais). (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
§ 3o Sem prejuízo das sanções civis e criminais aplicáveis ao responsável, a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação do ofendido, a retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatos em sítios da internet, inclusive redes sociais. (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013).
Resolução nº 23.457/2015-TSE
Art. 21. É permitida a propaganda eleitoral na Internet a partir do dia 16 de agosto de 2016 (Lei nº 9.504/1997, art. 57-A).
§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado na Internet somente é passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos. (...).
Analisando-se as provas trazidas aos autos pelo representante,verifica-se que os representados compartilharam vídeos apócrifos, com conteúdo supostamente difamatórios em relação ao candidato ao cargo de prefeito em disputa, o Sr. Júlio César, conforme prints das mensagens anexadas aos autos, especialmente os acostados nos documentos de nºs Id 75770, 75771, 75772, 75773, 75779 e 75780.
Os conteúdos das mídias referidas demostram que os representados compartilharam vídeos e imagens pelo aplicativo de internet whatsapp, em que associam a imagem daquele candidato a um caso de investigação por corrupção envolvendo o ex-prefeito da cidade, o Sr. Marcone Barreto, tudo apresentado no contexto das eleições suplementares de 1º de dezembro de 2019, o que caracteriza inequívoca propaganda eleitoral negativa.
Muito embora a defesa dos representados advogue que o compartilhamento de mensagens através do aplicativo de mensagens whastsaap não é alcançado pelo conceito de “redes sociais”, para fins de afastar a incidência da norma prevista no art. 57-D, §3º da Lei nº 9.504/97, tal conclusão não se mostra acertada, uma vez que a norma contida no art. 57-B, incisos III e IV, da Lei nº 9.504/97, é clara no sentido de permitir a propaganda eleitoral por meio de mensagens eletrônicas, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e aplicações de internet assemelhadas.
Ademais, o Superior Tribunal de Justiça – STJ entende que o uso do aplicativo Whastsapp está abrangido pelo conceito de “rede social”, veja-se:
PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO EXCESSO DE PRAZO. PREJUDICIALIDADE. SÚMULA 52/STJ. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. MODUS OPERANDI. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. ACESSO AOS DADOS CONTIDOS NO APARELHO TELEFÔNICO APREENDIDO. ALEGADA AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. ART. 5º, X E XII, DA CF. ART. 7º DA LEI N. 12.965/2014. OBSERVÂNCIA. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO. (...)11. Por se encontrar em situação similar às conversas mantidas por e-mail, cujo acesso exige prévia ordem judicial, a obtenção de conversas mantidas por redes sociais, tais como o whatsapp, sem a devida autorização judicial, revela-se ilegal.(STJ. RHC 102093 / PB, Quinta Turma. Rel. Min. Ribeiro Dantas. DJe 23/08/2019. Destaques acrescidos)
Sendo assim, não assiste razão à defesa dos representados quanto às alegações de que não houve propaganda eleitoral no caso e sim mero exercício da livre manifestação do pensamento, bem como da tese de que o uso do aplicativo whatsapp não subsume-se ao conceito de “redes sociais”.
Em relação as condutas dos representados, consistentes em “divulgar a propaganda eleitoral anônima”, estas restam devidamente comprovadas nos autos. É que, muito embora a autoria das mesmas não seja conhecida (vídeos apócrifos), seus divulgadores ou mensageiros o são (representados), o que atrai, sem dúvidas, a incidência da norma proscritiva insculpida no art. 57-D, §2º da Lei nº 9.504/97, a qual tem como destinatário pela multa “o responsável pela divulgação”. Nesse sentir, não assiste melhor razão ao Ministério Público Eleitoral.
Sobre o tema, veja-se o seguinte julgado:
EMENTA - RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA. PLEITO MUNICIPAL. DIVULGAÇÃO DE MENSAGENS EM SITE DE INTERNET. USO DE PSEUDÔNIMOS. NÃO IDENTIFICAÇÃO DO AUTOR. ANONIMATO. VEDAÇÃO. ART. 57-D DA LEI N.º 9.504/97. PUBLICIDADE NEGATIVA. MANIFESTAÇÕES OFENSIVAS. MULTA. SENTENÇA MANTIDA. IMPROVIMENTO.
A publicação, em site de internet, de mensagens anônimas de caráter eleitoral, é vedada, nos termos do art. 57-D da Lei n.º 9.504/97, sujeitando-se o responsável pela divulgação (provedor de acesso), à sanção de multa.
Não sendo possível identificar, efetivamente, a autoria das mensagens, deve-se tê-las anônimas, para efeitos legais, pois não trazem a assinatura do autor, não sendo admissível o uso de pseudônimos como meio de descaracterizar o anonimato, conceituado como abuso da liberdade do pensamento.
Restando comprovado que houve a divulgação, pela recorrente, de inúmeras mensagens eletrônicas, de natureza eleitoral, que afetaram candidatos a cargo eletivo, inexistindo a plena identificação dos autores, mas apenas, em alguns, o registro de denominações genéricas (Eleitor, Cidadão Cansado, Interessado), trata-se, pois, de propaganda eleitoral negativa, sob anonimato, o que enseja a responsabilização, nos termos do art. 57-F da Lei n.º 9.504/97, por afronta ao art. 57-D da mesma lei.
(TRE/MG. RE - RECURSO ELEITORAL n 25967 - Jardim/MS. ACÓRDÃO n 7524 de 25/09/2012. Relator(a) RENATO TONIASSO. Publicado em Sessão, Data 25/9/2012.Destaques acrescidos).
Com efeito, uma vez comprovado nos autos que os representados Francisco dos Navegantes Silvino Nicácio, Alexandre Pacheco, Antônio de Oliveira Fernandes e Diogo Fidelis Costa transgrediram a norma prevista no art. 57-D, §2º da Lei nº 9.504/97, impõe-se aos mesmos a aplicação da sanção nela prevista, isto é, a pena de multa eleitoral.
Considerando, por outro lado, que não há nos autos elementos suficientes a respeito das condições econômicas dos representados, bem como da extensão de eventual dano ocasionado ao candidato do representante, arbitro a multa eleitoral no patamar mínimo de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) aos representados.
Em relação ao pleito do representante sobre a aplicação de multa ao representado Diogo Fidelis da Costa, em face do descumprimento da ordem judicial proferida liminarmente, o mesmo deve ser indeferido, porquanto a prova apresentada pelo mesmo (imagem ID nº 118147) é incapaz de demonstrar que houve o compartilhamento dos vídeos e imagens guerreados após a notificação da decisão que a proibiu.
III – DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fundamento no art. 57-D, §§2º e 3º da Lei nº 9.504/1997, confirmo a decisão liminar proferida (ID nº 75875), para fins de determinar que os representados se abstenham de divulgar as mensagens objeto deste processo, bem como JULGO PROCEDENTE a pretensão autoral para fins de condenar FRANCISCO DOS NAVEGANTES SILVINO, ALEXANDRE PACHECO, ANTONIO DE OLIVEIRA FERNANDES e DIOGO FIDELIS COSTA ao pagamento de MULTA ELEITORAL no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Tendo em vista evidências do cometimento, em tese, dos crimes previstos nos art. 323 e/ou 324 do Código Eleitoral, determino a extração de cópias dos presentes autos e encaminhamento para a autoridade policial, para fins de investigação, conforme requerido pelo MPE em seu parecer.
Ceará-Mirim/RN, 03 de dezembro de 2019.
PETERSON FERNANDES BRAGA
Juiz Eleitoral da 6ª Zona